Preços variam de acordo com os bairros da cidade

Isaac Lira - Repórter

Duas lojas da mesma empresa na mesma cidade. Dois produtos da mesma marca. Um observador desavisado poderia concluir a partir dessas características que os preços praticados para esses produtos seriam iguais ou pelo menos semelhantes, certo? Errado. Não é incomum encontrar os mesmos produtos, de características exatamente iguais, com preços divergentes em lojas distribuídas pelas quatro áreas da cidade de Natal. A lista é longa e inclui desde itens da cesta básica até gasolina. A reportagem da TRIBUNA DO NORTE conversou com especialistas para tentar decifrar os motivos dessa diferença de preços, que confunde e condiciona consumidores em Natal e em outras cidades.
Alberto LeandroO preço de um produto depende de uma série de variáveis, inclusive do local do estabelecimento
O preço de um produto depende de uma série de variáveis, inclusive do local do estabelecimento

O que precisa ficar claro, primeiramente, é que não há ilegalidade nisso. Segundo Araken Farias, coordenador do Procon estadual, as empresas têm liberdade assegurada pela legislação vigente para definir os preços que irão praticar. A única exceção é quando há o que se chama de aumento abusivo, injustificado, do preço praticado. "A questão do preço é definida pela lei de mercado. O que não pode haver é um aumento injustificado. Se do dia para a noite, todos taxistas resolvem aumentar em 300% as suas tarifas, cria-se uma situação onde o Procon pode atuar. No mais, essa divergência é regulada pelas leis de mercado e é comum que haja divergências", aponta Aranken Farias.

É possível perceber claramente essas divergências no último boletim semanal do Procon de Natal acerca dos preços da cesta básica. O órgão costuma listar o ranking dos locais com preços mais em conta. O objetivo é mostrar ao consumidor qual empresa está vendendo a cesta básica com melhor custo/benefício. Contudo, é possível identificar essas diferenças mencionadas por Arakem Farias. Veja: no Nordestão, há três preços diferentes praticados em cestas básicas, sendo R$ 370 na unidade da Salgado Filho, R$ 371 na unidade de Cidade Jardim e R$ 379 na Zona Norte. 
Não é um fato que se resume ao Nordestão, mas compartilhado com os outros supermercados da cidade. No Carrefour, por exemplo, a unidade da Zona Norte cobrava, na última medição, R$ 383 pela cesta básica, enquanto que o da Zona Sul cobrava R$ 408. Segundo pessoas de extensa convivência com o comércio, essa situação é mais regra do que exceção.

Os números desmentem primeiramente a idéia, largamente difundida, de que o rio Potengi define automaticamente uma faixa de preço: na Zona Norte tudo é mais barato; na Zona Sul tudo mais caro. Diferenças de fato existem. Mas não são tão automáticas assim. "A questão do preço é definida por muitos fatores. Não dá para dizer que há um comportamento único, mas em muitos momentos os preços na Zona Norte e na Zona Oeste são mais baixos por uma questão de perfil de consumidor, de poder aquisitivo", diz Melquisedec Moreira, supervisor técnico do Dieese.

Segundo dados do Sebrae, a composição do preço utiliza variáveis objetivas, como os custos da mercadoria ou do serviço, e também subjetivas, como o valor da marca, o perfil dos consumidores, etc. Em outros momentos, o preço é uma forma de definir o público-alvo. "São situações realmente específicas. No que diz respeito às diferenças em Natal, há também uma questão de tradição. As pessoas na Zona Sul costuma pagam mais pelo serviço e nas zonas Norte e Oeste têm a tradição de não tolerar produtos muito caros. No fim das contas, tudo se resume à velha lei da oferta e da procura", diz Arakem Farias.

Concorrência é um fator decisivo 

O presidente da Associação dos  Supermercados do Rio Grande do Norte, Geraldo Paiva, que também é o proprietário do Rede Mais, afirma que a concorrência é o principal motivo para a divergência de preços entre produtos da mesma marca em lojas da mesma empresa, mas em localidades diferentes. "É um setor com uma realidade de muita competição. A disputa é acirrada e quando a concorrência baixa o preço a loja acaba tendo que fazer o mesmo para não perder mercado", aponta Paiva.

Nesse caso, a disputa acirrada em um bairro ou região faz com que determinada loja acompanhe os preços do concorrente. "Muitas vezes o empresário prefere sacrificar o lucro do seu empreendimento para acompanhar o concorrente e não perder mercado", diz Geraldo Paiva, atestando que o principal fator é a concorrência e a política de mercado, mas ressaltando também que os custos relativos a cada bairro também são uma influência forte.

O IPTU é um dos fatores, como também o valor dos terrenos. "Há custos fixos, como o IPTU e o gasto com funcionários. Se o funcionário mora longe, gasta-se mais com vale-transporte, por exemplo. São muitos fatores", diz Geraldo Paiva. Como a oferta de mão de obra é mais abundante na Zona Norte, é comum que se gaste mais com transporte na Zona Sul. "As lojas da Zona Sul "importam" mão de obra de outros locais", diz Geraldo Paiva.

Além das grandes lojas, há a concorrência com pequenos estabelecimentos de bairro. A concorrência, nesse caso, está ligada principalmente aos produtos mais prioritários, como arroz, feijão e carne. "Há competição em alguns artigos, e em outros não. Os estabelecimentos menores competem principalmente no que diz respeito a cereais e carne. Nesse caso, há uma competição forte, quando falamos de preço. Nos outros produtos, isso não acontece, porque o estabelecimento de grande porte tem condição de negociar diretamente com algumas indústrias", avalia.

Bate-papo

Melquisedec Moreira, supervisor técnico do Dieese

"Onde há infraestrutura os produtos são mais caros"

Existe uma diferença significativa nas diferentes zonas da cidade?

É comum em todas as cidades que as áreas do entorno, longe do centro, tenham preços mais em conta. E isso abrange muita coisa. Você tem terrenos mais baratos no entorno da cidade e isso é o primeiro ponto que é importante, porque é um dos custos. Há uma diferença associada ao poder aquisitivo.

A questão da infraestrutura também é importante?

Sim, os locais onde há uma maior infraestrutura - viária, de saneamento, de serviços oferecidos, como transporte e etc -  costumam ser mais caros. Além disso, as empresas com menos gente, por exemplo, tem menor custo operacional e isso também influencia. Agora, não dá para desprezar a questão do perfil do consumidor de cada local. E nesse caso a segmentação não é tanto por zona, mas por bairro.

Como assim?

É uma tendência das grandes redes entrarem nos barros, segmentarem nos bairros. Isso não acontece tanto em Natal, mas é uma tendência que deve ser seguida. Essas empresas procuram cada vez mais o Nordeste, em busca da Classe C em ascensão.

As empresas de menor porte ainda terão vez?

Sim, nesses casos o consumidor procura o atendimento personalizado. É sempre alguém da vizinhança, que conhece todo mundo. Isso faz a diferença.
Fonte: TN Online

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