Ex-ídolo do ABC relembra as suas melhores defesas e sonha com aposentadoria

Ex-ídolo do ABC relembra as suas melhores defesas e sonha com aposentadoriaAs características físicas fogem ao padrão de goleiro dos dias de hoje, especialmente seus 1,77m de altura. O bom humor, a irreverência e a simpatia, no entanto, permanecem as mesmas e o sorriso do eterno "Camisa 1 do ABC" também. Hélio Ribeiro Alves (61), ex-goleiro do alvinegro, é um dos maiores ídolos do clube e detém alguns feitos marcantes na história do Mais Querido, especialmente na década de 70. Sua atuação no time começou aos 20 anos de idade e foi tão marcante que a torcida confiava no plantel apenas ao saber que ele estaria em campo.

Por muito tempo, sua longa cabeleira chamava atenção a quem quer que fosse aos gramados ver os jogos do alvinegro, assim como o brinco que ele usava. Mas não faltam feitos para enumerar as façanhas de Hélio Show com sua especialidade: a bola nos pés, tanto no ABC quanto em outros clubes, como o Ceará, onde começou sua carreira. Ele era tão bom que seu passe foi vendido por 500 mil cruzeiros por cinco vezes. Alémdas conquistas no ABC, Hélio foi bicampeão estadual pelo América e tricampeão paraibano. Foi 13 vezes campeão nordestino. Atuando pelo Botafogo (PB), ganhou do Flamengo com Zico e companhia, por 5 a 1, em pleno Maracanã. Também atuou pelo Ceará e Treze de Campina Grande.

Na época em que jogava, o atleta treinava de forma diferente dos goleiros da atualidade. "Hoje pra ser goleiro é preciso ter mais ou menos 1,90m. Mesmo sendo baixo, eu fazia de tudo para ser bom. Treinava no Morro do Careca, nas arquibancadas, em todo lugar que pudesse", afirmou. Hélio pendurou as chuteiras atuando no América aos 40 anos de idade, em 1988, logo depois de perceber que estava com a vista cansada ao tomar um gol de Alcinei, do ABC.

"Um goleiro tem que ter a visão boa. Comecei a perceber que não tinha mais capacidade para atuar no futebol profissional. Vi que havia chegado o momento de parar, embora ainda tenha sido procurado depois por clubes como o Alecrim, Baraúna e Potiguar de Mossoró", afirmou.

Com exceção da Portuguesa de Desportos (SP), o ex-goleiro preferiu fazer carreira nos times regionais. Não faltam feitos marcantes na história do jogador. A carreira começou em 1970. Hélio Show jogou apenas duas partidas na equipe júnior do Ceará. "Depois passei pro profissional e não sai mais", disse. Dois anos depois, o goleiro já se mostrava uma revelação. Foi no Campeonato Brasileiro de 1972, mais precisamente no dia 14 de dezembro, que ele chamou a atenção de grandes clubes do Sudeste, como Palmeiras e Santos. "Fiz de tudo pra evitar a derrota do Ceará para o Corínthians. Aos 45 do segundo tempo, sofri o gol de um jogador chamado Sicupira".

Atleta do século
Pelo Ceará, Hélio foi tetracampeão estadual. Depois, veio brilhar no "Clube do Povo" de Natal. A passagem pelo ABC - entre 1975 e 1979, marcou a era de ouro de Hélio Show. Sua atuação foi tão importante que ele foi considerado, ao lado de Ribamar, um dos melhores goleiros da história do clube. Hoje ele é condecorado, ao lado de outros grandes ídolos do ABC, como Marinho Chagas e Alberi, atleta do século, e figura na galeria dos grandes ídolos alvinegros.

Hélio também é imbatível em outra marca: é o segundo goleiro brasileiro a passar mais tempo sem tomar um gol: 1.137 minutos. Ele só perde pra Mazaropi (Grêmio), que acumulou 1.600. "Fiquei doente quando tomei o gol. Foi um gol fuleiro, sem vergonha, marcado por Maranhão Barbicha, do Potiguar (Mossoró)", afirmou. O ex-goleiro também era brincalhão, mesmo estando trabalhando. "Cheguei a furar oito bolas aos 30 minutos do primeiro tempo porque queria acabar o jogo", contou, referindo-se a partida Botafogo e Campinense (PB), em 1981. "Também não perdoava adversário abusado. Cheguei a furar a bunda de um centroavante abusado. Eles não respeitavam, chutavam a cara do goleiro".
A bomba de Rivelino
A alcunha Hélio Show surgiu do apelido dado pelo radialista da rádio Cabugi, Souza Silva. Antes disso ele era chamado "Goleiro Nota 10" pelo narrador Júlio Sales, da emissora de TV Uirapuru, quando defendeu o Ceará e esteve cara a cara com grandes goleadores da época. Ninguém menos que Pelé e Rivelino tentaram furar o paredão. Pelé não conseguiu: o Ceará venceu por 2 a 1. Rivelino fez o gol, porém deixou uma marca física: o chute foi tão forte que a bola quebrou um osso do dedo mindinho da mão direita. "O dedo não fazia diferença, nunca tive problema porque tinha meu próprio jeito de defender, com essa mão direita", disse.

Apesar de lamentar ter perdido a oportunidade de tirar uma foto ao lado do Rei do Futebol, Hélio Show se orgulha de ter sido pioneiro em muitas façanhas futebolísticas. Uma delas foi inscrever o número 101 nas costas de seu uniforme, ousando em 1972 ao substituir a tradicional camisa "1" e se antecipar à prática que é relativamente comum nos dias de hoje. "Estava no Ceará. Soltei uma mentira, disse que era pra representar doze pontos que acertei na loteria esportiva. O pessoal acreditou", brincou. Hélio parecia gostar de desafios e decidiu atuar numa final de Campeonato Cearense doente de catapora. "Eu estava todo feridento, mas era a decisão e eu, ainda um menino, nem me importei. O juiz era pernambucano e não queria deixar eu jogar. Resolvi, então, colocar uma calça. Fui o primeiro goleiro a jogar com calça, em 1976", revelou.
Maior defesa da história
O dedo quebrado é uma das poucas sequelas que Hélio Show teve em sua carreira. A outra é clássica, e também entrou para a história do ABC. Era final de campeonato estadual em 1976, o Mais Querido enfrentava o América no domingo e Hélio Show estava com o braço esquerdo fraturado, engessado e enrolado numa tipoia. À distância, ao ver o treino de apronto, na sexta-feira, ele anunciou à diretoria: "Vou jogar". Boquiabertos, os dirigentes do clube na época, Zeca Passos, Heriberto Rocha, Souza Silva, Fernando Bezerra e o presidente Aluízio Bezerra, duvidaram da declaração. Bezerra, inclusive, perguntou ao atleta: "Tem certeza que dá para jogar?" e ele sinalizou positivamente. Pois bem, o massagista retirou o gesso e, no sábado, ele já estava lá, correndo no campo. "Com o anúncio, o CT do ABC lotou. Imprensa, torcedores, todos queriam saber se eu iria jogar mesmo. Ao final, repeti: estou pronto. No dia seguinte, joguei mesmo", comentou.

Por precaução, nesse treino ele defendeu apenas duas bolas. Não obstante, o jogo foi o maior desafio e também a melhor atuação da história de Hélio. Ao longo da partida, fez várias defesas: Alberi, Pedrada, Santa Cruz. Vários jogadores tentaram, todos sem sucesso. "Aos 44 do segundo tempo, zero a zero no placar e Santa Cruz deu um limão, como costumamos chamar os chutes fortes. Ele chutou de canhota, espalmei, no rebote ele chutou de novo e com o braço quebrado, coloquei a bola pra escanteio", explicou. "Depois dessa defesa, você não pode mais levar gol. Vou encerrar a partida", disse-lhe o árbitro, Oscar Escolferi.
Realidade
Hoje o ex-atleta é mais Hélio Ribeiro Alves do que Hélio Show, embora leve o apelido onde quer que esteja. Ele vive e trabalha no bairro de Lagoa Azul, Zona Norte da capital, e divide sua rotina entre a vida pacata com a terceira mulher, a caicoense Luzia Dantas, e a atividade de bugueiro profissional, com direito a empresa aberta. Hélio também encontra tempo para seus cinco filhos, todos formados, com carreira própria. Se engana, porém, quem acha que ele tem vida pacata. "A atividade de bugue também é fascinante.

Quando estou nas dunas, fazendo manobras, me sinto muito bem. Vivo feliz hoje", desabafou. Durante a carreira, Hélio acumulou patrimônio. Comprou casas em Natal (bairro de Candelária), em Fortaleza, na Paraíba, e nas praias de Santa Rita e Pitangui. Também ganhou prêmios: automóveis e dinheiro. "Hoje em dia me desfiz de parte do meu patrimônio. Por vontade própria mesmo, os filhos foram casando e dei de presente pra eles".
O sonho da aposentadoria
Hélio chegou a voltar aos gramados em 1995, trabalhando como treinador de goleiros paralelamente à atividade de empresário de bugues, Hélio se afastou de vez da atividade em 2002, depois de seis anos nessa função, no ABC, e breve passagem no Coríntians de Caicó. "O ABC deveria fazer como alguns clubes do Sudeste, que mantém ex-atletas trabalhando no time mesmo que seja desempenhando funções de supervisão, por exemplo. Mas eu reconheço que sai do ABC por vontade própria", diz. Atualmente Hélio só participa de jogos beneficentes pelo ABC. Hélio parabeniza os presidentes Judas Tadeu e Rubens Guilherme, e a diretoria inteira, mas acha que o clube deveria oferecer mais aos seus ex-ídolos. "Tenho reconhecimento de todos na diretoria, mas nas coisas mais simples encontro falhas. Na bilheteria do Frasqueirão, por exemplo, encontro dificuldades para entrar nos jogos. Colocam pessoas que não conhecem nem mesmo os ex-atletas do clube".
O objetivo de Hélio é se aposentar como atleta profissional. Já pode fazer isso,mas busca, com a diretoria do ABC, incorporar à sua carteira profissional os sete anos em que atuou como treinador de goleiros do clube. "É um mínimo que pode ser feito a alguém que deu a vida pelo time do coração, que chegou até mesmo a jogar com o braço quebrado para garantir um bom resultado".

Carreira

1970 - Ceará (CE)

1972 - ABC (RN)

1980 - Portuguesa (SP)

1981 - Botafogo (PB)

1982 - Treze de Campina Grande (PB) *teve breve passagem, em 1983, pelo Ferroviário (CE), mas voltou ao clube paribano

1987 - América (RN)

1988 - Deixou os gramados, decidiu trabalhar como bugueiro

1995 - Preparador de goleiros do ABC, até 2002

2011 - Tem uma empresa de bugues, busca aposentar-se como ex-atleta profissional
De Sérgio Henrique Santos, especial para O Poti

Nenhum comentário:

Postar um comentário