M aria Rocha é costureira e tem 63 anos de idade. É avó de 22 netos e mãe de 11 filhos. Mas, presente de fim de ano, ela só quer um: “que chova bem muito”. Vasilhas, baldes, garrafões e tambores de água marcam o lugar dela na fila. Com as torneiras vazias, é precisa recorrer a chafarizes para ter o que beber.
Maria mora em Santana do Matos, na região central potiguar. A cidade tem pouco mais de 13 mil habitantes, e entrou em colapso no abastecimento faz um mês. “É um sofrimento sem fim. Nossa virada de ano vai ser de oração e fé. Que Deus nos ajude, pois precisamos muito que volte a chover”, disse ela, repleta de esperança.
Na cidade, o G1 encontrou outra Maria. Além do mesmo nome, as dificuldades e os sonhos também são iguais. Disse ela:
"Peço a Deus todos os dias que mande chuva. O fim do ano está chegando e eu não vou ter dinheiro para presentear meus filhos nem meus netos. Isso é muito triste"
As previsões para 2018 são um alento, mas não garantias. Segundo a Empresa de Pesquisa Agropecuária do Rio Grande do Norte (Emparn), o estado deve ter chuvas acima da média ano que vem, mas nada suficiente para encher os grandes reservatórios. Caso contrário, o sofrimento das marias e de quase toda a população do estado não tem como diminuir.
Atualmente, dos 167 municípios potiguares, 153 estão em situação de emergência por causa da seca. Isso significa 92% do estado. A estiagem, que já dura seis anos, é considera a mais severa da história. E os prejuízos, segundo o governo, já passam dos R$ 4 bilhões por causa da redução do rebanho e do plantio.
Santana do Matos entrou em colapso no dia 23 de novembro, quando a Companhia de Águas e Esgotos do RN (Caern) interrompeu o abastecimento e suspendeu a cobrança das contas. Isso aconteceu porque o Açude Rio da Pedra, que tem capacidade para 12 milhões de metros cúbicos de água, praticamente secou. O pouco de água que resta, não presta para o consumo. Nem peixes têm mais.
FOTOS: Açude Rio da Pedra seca e Santana do Matos (RN) entra em colapso d'água
Sem o serviço da Caern, coube à prefeitura assumir o papel de fornecedora. Quatorze caixas d'água foram espalhadas pelos bairros. Chamadas de chafarizes, as caixas são abastecidas diariamente por carros-pipa. Mas, como cada uma só tem capacidade para 5 mil litros, é preciso chegar cedo às filas.
“Passo o dia todo nessa luta, carregando água para cima e para baixo. Faço isso umas 10 vezes só pela manhã”, reclamou o aposentado José Ferreira de Medeiros, de 76 anos. “Não tem outro jeito, é no braço mesmo que eu levo. Pesa muito, mas eu vou devagarzinho e vai dando certo. Fazer o que?”, conformou-se.
Água amarelada
“Quem não precisa de água? Todo mundo precisa. É com ela que a gente cozinha, lava roupa e toma banho”, disse a agricultora Maria Socorro Alves, de 51 anos, apontando para o balde cheio. A coloração amarelada, segundo ela, não é problema. “É água do poço, moço. Por isso tem essa cor. Mas não tem cheiro ruim. É bem docinha e também dá pra beber”, afirmou.
Secretário municipal de Agricultura, Abastecimento e Recursos Hídricos, Patrício Pinheiro disse ao G1 que a água que a prefeitura usa para abastecer os chafarizes realmente vem de açudes públicos e poços. Ele ressaltou que foram feitos testes, e que os resultados de qualidade apontaram que a água pode ser consumida, mas que é preciso tomar cuidados antes de bebê-la. “É bom ferver”, ressaltou.
Ainda de acordo com o secretário, além do abastecimento oferecido à população da área urbana com os chafarizes, a prefeitura também escavou 14 poços artesanais para tentar minimizar os efeitos da seca. Já na zona rural, que possui três distritos, é o Exército Brasileiro quem está enchendo as cisternas dos moradores.
Conta cara
Maria do Rosário tem 62 anos. Ela também sofre para levar água para casa. Mais que isso, vem passando dificuldades quando precisa comprar. “Não uso essa água amarela pra tudo. Dá pra tomar banho e lavar roupa, mas para cozinhar e beber eu preciso comprar. Em minha casa, que tem cinco pessoas, eu pagava uma conta de R$ 40 para a Caern e a água dava o mês todo. Agora, para pegar mil litros, que dá no máximo para uns quatro ou cinco dias, eu tô pagando R$ 30 para os carroceiros. Tá saindo muito caro”, reclamou.
“Estamos orando para volte a chover. Precisamos do nosso açude cheio, ou vamos acabar passando fome também. Um inverno bom é o melhor presente que Papai Noel pode nos dar”, emendou.
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