Pai, mãe e filho são condenados

Fred Carvalho e Ricardo Araújo - repórteres

Três dias de juri, 31 horas entre interrogatórios, argumentações de acusação e defesa. Passava das 21h de ontem quando a juíza titular da 1ª Vara Criminal de Parnamirim, Cínthia Cibele Diniz de Medeiros, proferiu a sentença da família Thies. Por unanimidade, todos foram considerados culpados pelos jurados. Para a matriarca Mariana, 19 anos de prisão pelos crimes de homicídio e ocultação de cadáver. Ao Amilton, a mesma sentença pelos mesmos motivos. Ao sargento da Aeronáutica e réu confesso, Andrei Bratkowski Thies, 18 anos de reclusão em regime inicialmente fechado, pelo assassinato da sua ex-mulher e ocultação dos seus restos mortais. A confissão dos atos por Andrei foi uma decisão favorável na contagem final da sua sentença.

Ao ouvirem a decisão dos jurados, proferida pela magistrada, a família considerada culpada pela morte da dona de casa gaúcha Andreia Rosângela Rodrigues, não esboçaram nenhuma reação. Do mesmo modo que começaram o julgamento, na terça-feira passada, terminaram ontem à noite, apáticos. Na saída dos pais e do irmão do Fórum Tabelião Otávio Gomes de Castro, a única filha do casal Thies, Viviane, chorava copiosamente. Nenhum membro da família concedeu entrevista. O advogado Álvaro Filgueira, que defende a família, não concordou com a sentença.

"O seu Amilton e a dona Mariana foram condenados por um único motivo: o clamor social. Não consta nada nos autos que os incrimine", falou. O defensor antecipou que irá recorrer da sentença judicial na semana que vem. "Como amanhã [hoje] já é sexta-feira, não tenho tempo para preparar o recurso. Vou estudar a sentença durante todo o fim de semana e na próxima semana irei recorrer", ressaltou. Álvaro disse que o recurso vai abranger Andrei, Amilton e Mariana, uma vez que ele considerou alta a condenação do sargento da Aeronáutica.

A sentença dos Thies foi baseada nos artigos 121 e 211 do Código Penal Brasileiro (homicídio qualificado e ocultação de cadáver, respectivamente). A pena mínima para homicídio qualificado é de 12 anos. Andrei, além da pena mínima, teve quatro agravantes no assassinato que resultaram em 16 anos de pena básica pela morte de Andreia. Pela ocultação dos seus restos mortais, foi imputada a sentença de mais dois anos. No total, ele foi sentenciado em 18 anos de reclusão em regime inicialmente fechado. Ele não poderá recorrer em liberdade.

As penas de Mariana e Amilton Thies foram as mesmas, 19 anos de reclusão. A pena base, pelo homicídio, foi de 16 anos e seis meses para ambos. Pela ocultação do cadáver, mais dois anos e meio de prisão cada um. Os pais de Andrei tiveram um acréscimo de seis meses na penalidade básica pois não confessaram os crimes, diferente do filho que acabou sentenciado com uma reclusão menor. A promotora Ana Márcia Morais Machado, disse que estava satisfeita com a sentença. "Era o que eu esperava. Foi uma decisão normal", comentou. Ela fez críticas à Constituição Brasileira. "A nossas leis brasileiras precisam mudar muito para se fazer uma justiça mais justa", enfatizou.

A irmã de Andreia, Pricila Rodrigues, não escondia o nervosismo ao longo da leitura da sentença. Ela chorava, enquanto esfregava uma mão na outra. Encerrada a sessão, Pricila foi saudada pelos estudantes de Direito que acompanharam o julgamento e chorava de alegria pelo resultado dos três dias de depoimentos. Ela agradeceu pessoalmente à promotora e à juíza e evitou permanecer próxima dos condenados. Na calçada do Fórum, Pricila vestiu uma camisa com a foto de Andreia onde havia escrito o nome justiça. Ele ergueu os dedos em forma de "V" e dizia a palavra vitória.

Ela agradeceu a todos que a apoiaram e se dizia muito feliz com a condenação. Em seguida ela ligou para Andressa, filha mais velha de Andreia para contar o resultado do julgamento. Andressa chegou a contestar o período determinado pela magistrada, mas Pricila disse que a decisão foi justa. "É estranho dizer que eu estou feliz, mas a justiça foi feita", declarou Pricila.

Defesa optou pela redução de pena

Em 34 minutos de argumentação - e em seu primeiro juri popular -, o advogado Álvaro Filgueira tentou convencer os jurados de que Andrei matou a ex-mulher num momento de emoção. Fazendo leitura de trechos do Código Penal Brasileiro, o defensor solicitou aos jurados que analisassem o caso com imparcialidade e levando em consideração o fato de que a emoção pode levar o ser humano ao enfraquecimento ou ao fortalecimento. "Nós não queremos a absolvição do Andrei, mas sim a redução da pena", argumentou o advogado.

Segundo Filgueira, a atitude de Andrei foi um reflexo da provocação de Andreia em dizer que voltaria para Porto Alegre com as filhas e que arrumaria um novo pai para as meninas. "Ele fez aquilo pela emoção de pensar na perda da mulher e da filha amada. Ele era um bom filho, um bom pai e um excelente militar", destacou o defensor. Além disso, ele afirmou que Andrei agiu com uma "sinceridade acima da média" ao assumir que havia matado a ex-mulher e relatando os detalhes de como o crime ocorreu.

O defensor do sargento ressaltou que seu processo de recuperação, com a busca de Deus através da Bíblia e de ajuda psicológica, deveriam ser levados em consideração no momento do julgamento. "Me parece que a sociedade não tem interesse na recuperação de quem cometeu um crime. Ele tem todo direito e deve se arrepender", disse solicitando que os jurados não se deixassem comover pelo clamor da população em relação ao caso. Álvaro Filgueira criticou o modo como a representante do Ministério Público Estadual expôs sua argumentação em relação ao crime.

Em seguida, o advogado Caio Túlio Braga assumiu a defesa dos réus diante dos jurados. Ele enalteceu que sua principal preocupação era com o juri além de ter afirmado que todos que estavam ali tinham 90% de conhecimento do caso. "Julguem o que foi dito pelo Ministério Público Estadual e pela defesa. Não pelo o que foi dito lá fora (nas ruas). Eles já foram condenados pela sociedade", destacou.

Caio Túlio Braga, convocado por Álvaro Filgueira para atuar como auxiliar, defendeu, basicamente, os pais de Andrei - Mariana e Amilton Thies. Ele negou a participação de ambos no crime e disse que "se Mariana e Amilton saírem daqui (do Fórum) em liberdade, não terão sossego". Caio Túlio destacou que o papel da defesa era provar que não existiam provas suficientes para a condenação dos réus - Mariana e Amilton. "O Estado já os condenou."

Promotora se diz satisfeita com resultado

A promotora de Justiça Ana Márcia Machado, que atuou no júri popular se disse satisfeita com as condenações dos três e com as penas aplicadas. "As penas dadas a Amilton e à Mariana, a meu ver, foram muito boas. Eu só achei que Andrei, por ser marido de Andreia, merecia uma sentença maior. Mas estou muito satisfeita porque a justiça foi feita. Os três planejaram e executaram esse assassinato e a ocultação do cadáver. Por isso, tiveram o que mereceram", comentou a representante do Ministério Público.

Ana Márcia Machado fez questão de frisar que a morte de Andreia teve três culpados e três vítimas. "Os culpados por esse crime são esses que foram condenados: Andrei, Amilton e Mariana. Mas esse assassinato não teve apenas a Andreia como vítima. Além dela, há ainda a Andressa, que já sabe o que aconteceu com a mãe e sofre por isso; e a Andrielle, que quando crescer vai saber que o próprio pai matou a mãe da maneira tão cruel como foi".

Durante os debates, Ana Márcia pontuou a participação de cada integrante da família Thies no crime. "O Andrei viveu um momento em que teve de decidir pela mãe ou pela mulher, a Andreia. Infelizmente ele decidiu pela mãe e, ao invés de deixar a Andreia ir embora, aceitou o plano de morte. O Amilton também não tinha poder sobre a Mariana e participou diretamente do assassinato, ajudando o Andrei a matar a Andreia. Já a dona Mariana é mais perigosa. Ela planejou tudo, foi a autora intelectual", falou.


Família Thies chora após sentença
Mariana Bratkowski Thies, tida como uma mulher fria e calculista, chorou durante o júri popular que a condenou a 19 anos de prisão. O marido dela, Amilton, também chorou bastante - principalmente nos momentos finais do julgamento. Outra que não conteve as lágrimas foi a filha do casal, Viviane, que veio de Porto Alegre para acompanhar o júri.

O único que não chorou - nem mesmo com a condenação dos pais - foi o sargento Andrei Thies. O militar permaneceu a maior parte do tempo estático, fixando o olhar ora na promotora de Justiça Ana Márcia Machado, ora nos advogados que o defendiam - Álvaro Filgueira e Caio Túlio Dantas Bezerra.

As únicas expressões de Andrei se resumiram a três momentos: quando não concordava com o que era dito pela promotora, ele balançava a cabeça negativamente; quando concordava com algo dito pelos seus defensores abria um pequeno sorriso; e quando havia intervalos no júri ele se levantava e conversava com os pais e com a irmã.

As reações de Amilton e Mariana ontem foram mais variadas. A mãe de Andrei começou a chorar no período da tarde. Depois disso, por diversas vezes, ela baixou a cabeça e chorou. Na maioria das vezes enxugou o rosto com um lenço dado pela filha.

Já Amilton se mexia mais na cadeira em que estava sentado. Na maior parte do tempo manteve uma das mãos no queixo. Também balançava a cabeça quando não concordava com algo que era dito nos debates. Não sorriu nenhuma vez.

A maior demonstração de afeto entre os membros da família Thies se deu após a leitura da sentença. Enquanto aguardavam as suas respectivas escoltas, os quatro - pai, mãe, filho e filha - se abraçaram e se beijaram. Isso porque eles não sabem quando poderão repetir esses gestos e essas trocas de carinho.

Os primeiros a deixar a sala de audiência foram Amilton e Mariana. Assim que a escolta da Coape chegou, eles foram algemados e reconduzidos para os locais onde já estavam presos. Cerca de 20 minutos depois, foi a vez de Andrei sair do prédio. Os soldados da FAB que o escoltavam deixaram o fórum pela porta dos fundos. Mesmo assim o carro em que ele foi conduzido foi alvo de chutes e socos das pessoas na rua.

Após a saída de Andrei, Viviane ainda aguardou no fórum até que a movimentação de pessoas diminuísse. Ela continuou chorando.

Populares comemoram condenação

Passava das 22 horas quando Andrei, Amilton e Mariana Thies deixaram o Fórum de Parnamirim. Mesmo com esse horário, centenas de pessoas se aglomeravam em frente ao prédio onde a família Thies foi julgada. "Assassinos! Vocês tiveram o que mereceram! O lugar de vocês é mesmo na cadeia!", gritavam as pessoas na rua.

Devido à quantidade de pessoas e ao clamor provocado pelo júri, o policiamento teve que ser reforçado para evitar um linchamento dos réus. Em cada dia do júri, mais de 30 PMs participaram da segurança do fórum. Além deles, soldados da Aeronáutica auxiliavam na segurança de Andrei.

Um outro momento de grande movimentação após a leitura da sentença do júri foi quando a irmã de Andreia, Priscila, saiu do fórum. Ela foi aplaudida pelas pessoas. "A justiça foi feita. A Andreia agora vai poder descansar em paz, pois esses monstros vão mofar na cadeia", disse o vigilante Ronaldo de Assis. "Agora espero apenas que as filhas delas fiquem bem", concluiu.

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