CLIPPING: Natal registra muitos casos de violência contra homossexuais

CAIO LHENNYSSON DA Silva Costa, 18 anos. Milton Bezerra Furtado, 55. Adriano Soares Trigueiro, 34. Lineker da Silva Nascimento, 21. Eles não moravam no mesmo bairro, não frequentavam os mesmos
 ugares, não trabalhavam juntos e não pegavam o mesmo ônibus. Nem ao menos se conheciam. Afinal, o que os quatro têm em comum? Eles foram assassinados nos últimos trinta dias, com requintes de crueldade e eram homossexuais. Para a polícia, são apenas tristes coincidências. Porém, para o Fórum LGBT – instituição que há três anos defende lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais no Rio Grande do Norte – as mortes têm ligações que vão além de um infeliz acaso: homofobia.
“Homofobia, sim. Não apenas pela forma bárbara e cruel, mas porque todas as mortes foram cometidas como intolerância. Os assassinos silenciaram suas vítimas porque elas eram homossexuais”, denunciou Érica Maia, diretora do Fórum, cobrando uma resposta da Polícia Civil. Antes de 2007, segundo levantamento da entidade, 37 pessoas morreram no estado vítimas de algum tipo de preconceito sexual. Nos últimos três anos, uma lésbica e um gay também morreram em função de suas opções afetivas. “Agora, depois que a questão homoafetiva voltou ao centro das discussões, com a aprovação do casamento de casais do mesmo sexo, e principalmente depois que a presidente Dilma Rousseff reprovou o kit que combatia a homofobia nas escolas, já tivemos quatro mortes de homossexuais na Grande Natal.
Algo precisa ser feito antes que outros morram”, observou Paulo Renan, que também dirige o Fórum. Durante a entrevista ao NOVO JORNAL, os dois diretores afirmaram acreditar que os últimos assassinatos envolvendo homossexuais foram motivados, sem dúvidas, em razão da intransigência com relação às opções sexuais das vítimas. O mais recente, a propósito, aconteceu na noite do sábado. Foi por volta das 22h, na esquina da Avenida Deodoro da Fonseca com a Rua General Osório, no Centro da cidade, praticamente nos pés do edifício onde funciona a Secretaria Estadual de Saúde, a Sesap. Na ocasião, o travesti Lineker Nascimento, que adotou o apelido de Kênia para fazer programas, sofreu vários tiros à queima-roupa e morreu na hora. A polícia ainda não sabe quem são os assassinos ou o que teria motivado o crime. Mas, a princípio, não acredita em homofobia.
O mesmo aconteceu com o cozinheiro Adriano Trigueiro, assassinado no último dia 11. Ele foi encontrado morto dentro do quartinho onde morava, numa pequena vila localizada na Rua Desembargador Lemos Filho, no bairro das Rocas. Ou seja, apesar de ter sido achado sem roupas e com marcas de espancamento na cabeça, a polícia ainda não tem certeza de que o rapaz tenha sido vítima da ira de pessoas preconceituosas com relação à sua sexualidade.
ABUSO
Em situação semelhante está o processo do auxiliar de enfermagem Caio Lhennysson, que também perdeu a vida de forma estúpida e brutal. O corpo do jovem foi encontrado na madrugado do dia 30 de maio, num terreno baldio próximo de sua casa, na Rua Libanês, bairro Novo Amarante, em São Gonçalo. Antes de ser espancada e asfixiada, a vítima sofreu abuso sexual, teve partes do corpo queimadas com cinzas de cigarro e ainda foi obrigada a engolir pedras e areia. Três suspeitos foram detidos e levados à delegacia uma semana depois. No entanto, como não houve flagrante delito, todos foram liberados e irão responder às acusações em total liberdade. Um deles, inclusive, admitiu ter matado Caio porque o rapaz era gay. O nome do assassino não pode ser revelado, pois se trata de um menor de 18 anos, portanto, protegido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
Por fim, ainda sem culpados e sem motivação aparente, segue a investigação sobre a execução do confeiteiro Milton Furtado, na Zona Norte. O homem, que era homossexual assumido, trabalhava vendendo doces na porta de escolas dos bairros de Cidade Alta e Ribeira. Seu corpo foi encontrado no dia 17 do mês passado, três dias antes da morte do auxiliar de enfermagem. Perícias feitas pelo Itep constataram que Milton sofreu muito antes de morrer, sendo provavelmente assassinado com violentos golpes de pá.
Parada Gay este ano vai exigir criminalização da homofobia
O Fórum LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais) é a instituição potiguar responsável pela Parada Gay de Natal. Este ano, o evento está programado para acontecer no dia 14 de agosto. O percurso já foi definido. A concentração será em frente ao restaurante Sal & Brasa, na Avenida Engenheiro Roberto Freire, bairro de Capim Macio. De lá, a manifestação seguirá para a Árvore Natalina no bairro de Mirassol, também na Zona Sul da cidade. A grande expectativa fica por conta da participação, cujo público está sendo estimado em mais de 150 mil, trinta mil a mais que o registrado ano passado. Para isso os organizadores apostam no tema como principal motivador: “Criminalização da Homofobia. PLC-122 Já!”
O tema escolhido coincidiu com as quatro mortes de homossexuais ocorridas na Grande Natal? Não. Foi proposital mesmo. O assunto vem, justamente, para chamar a atenção das autoridades. Trata da violência que atinge as pessoas que sofrem preconceito e, principalmente, da falta de uma punição para quem descrimina os homoafetivos, sejam eles gays, lésbicas ou, simplesmente, simpatizantes. É a luta pela regulamentação do Projeto de Lei da Câmara Federal nº 122/2006, que prevê multa e prisão de um a três anos para quem praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião, origem, condição de pessoa idosa ou com deficiência, gênero, sexo, orientação sexual ou identidade de gênero. Atualmente o PLC-122 aguarda parecer da relatora, senadora paulista Marta Suplicy.
No Rio Grande do Norte, uma lei semelhante (9.036/2007) do deputado estadual Fernando Mineiro prevê punição em caso de preconceito contra gays ou lésbicas que sofrerem preconceito ou discriminação dentro de prédios públicos. “Eles podem se beijar e trocar carinhos como um homem e uma mulher fazem normalmente. Dentro de um prédio público, pode”, frisou Paulo Renan.
Fórum LGBT cobra audiência com secretário
Convencidos de que os quatro gays assassinados nos últimos trinta dias realmente foram vítimas de homofobia, o Fórum LGBT decidiu pressionar a Secretaria de Segurança Pública e da Defesa Social (Sesed). O primeiro objetivo é apresentar ao secretário Aldair da Rocha uma pauta de reivindicações. Mas, para isso, a diretoria da entidade cobra uma audiência com o titular da pasta. “Desde que ele assumiu, estamos tentando marcar esta reunião”, reclamou Paulo Renan, acreditando que é possível o encontro acontecer ainda esta semana. “Quatro já morreram. Não é possível que agora ele não se sensibilize”, emendou.
Consta na pauta a ser discutida com o secretário Aldair da Rocha, uma série de medidas que visam garantir um tratamento diferenciado para as pessoas amparadas ou não pelo Fórum, seja alguém que ainda tenha receio de admitir publicamente sua sexualidade, ou alguém já assumido como gay, lésbica, bissexual, travesti ou transexual. “Queremos uma resposta da Secretaria de Segurança. Estas mortes não podem ficar impunes. Queremos que os assassinos paguem pelo que fi zeram. Isto é o mínimo”, ressaltou Érica Maia, acrescentando que, além de exigir investigações céleres para os assassinatos, a Sesed também precisa reativar o número do Disk Defesa Homossexual (0800-28-11314), desabilitado há três anos; reabrir o Centro de Referência de Combate à Homofobia, o CRCH, fechado em agosto do ano passado; e criar a Coordenação de Direitos Humanos LGBT, antiga reivindicação da instituição.

Fonte: Novo Jornal

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