Areia Preta: Décadas de esgoto na praia


Paisagem da praia de Areia Preta é uma mistura dos modernos arranha-céus com o despejo de dejetos humanos na areia. Foto: Wellington Rocha
Paisagem da praia de Areia Preta é uma mistura dos modernos arranha-céus com o despejo de dejetos humanos na areia. Foto: Wellington Rocha
A paisagem moderna dos arranha-céus de Areia Preta contrasta com uma situação observada a poucos metros de distância da portaria dos mesmos que remete a séculos passados: dejetos humanos são despejados na praia onde turistas e nativos passam horas de lazer. Limite da avenida Café Filho com a Governador Sílvio Pedrosa, o trecho que liga a Estação Elevatória de Areia Preta, conhecida como a do Relógio do Sol, à praça da Jangada tem dois pontos de poluição direta.
O primeiro deles jorrava água pútrida, na manhã do último sábado (16). Abaixo da praça da Jangada, uma poça de dejetos se avolumava, enquanto banhistas negligenciavam o perigo para a saúde. Acompanhado da esposa, o aposentado baiano Alfredo Alcione veio visitar a filha em Natal e aproveitou para relaxar na praia. “Lá em Salvador a situação está melhor. Não vemos mais o esgoto caindo diretamente na areia. Isso é um absurdo. Venho aqui há cinco anos e sempre foi assim. Incomoda, sim, não vou negar”.
Local freqüentado por parte da elite natalense, inclusive pelo prefeito de Natal, Carlos Eduardo Alves, que reside no bairro, a praia de Areia Preta tem na Estação do Relógio do Sol o ponto nervoso do problema ambiental. Responsabilidade dividida entre as secretarias Municipais de Meio Ambiente e Urbanismo (Semurb) e Obras Públicas e Infraestrutura (Semopi) e a Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do Norte (Caern) – esta, acionada pelo Ministério Público por descumprir determinações quanto ao esgotamento sanitário.
Morador de Mãe Luiza desde o nascimento, Pedro Rocha, 49 anos, é um porteiro de prédio que pisa na areia da praia todos os dias. Ele classifica a situação atual como a melhor dos últimos anos, mas reclama dos focos de dejetos ainda existentes. “Melhorou muito, mas veja ali como tem lama podre, com fezes e tudo de ruim. Quando chove, então, aparece tudo que não presta: rato, barata e uma água preta e fedorenta. Quando fica assim, ninguém desce pra praia”. Doenças de pele e nos olhos são aceitas com naturalidade. “Todo mundo tem, né?”.

A estação das chuvas que está prestes a começar desperta preocupação do operador de sistema da Estação de Tratamento da Caern no Relógio do Sol, José Macêdo. Mesmo com os investimentos realizados em 2012 (triplicação da capacidade de bombeamento de efluentes da Estação com obras e a aquisição de duas novas bombas para lançar o material orgânico até uma estação no Passo da Pátria), ele diz que “quando chove, não dá vencimento. O povo tem culpa por fazer ligações clandestinas que entopem bocas de lobo e a Prefeitura por não ver isso e não cuidar das águas pluviais”. São quatro funcionários para manter a Estação do Relógio do Sol em atividade por 24 horas.
Para o secretário municipal do Meio Ambiente e Urbanismo, Marcelo Toscano, essas ligações feitas pela população criam dificuldades para o poder público, sobretudo no período chuvoso. “Tivemos uma reunião na semana passada entre a Semurb, a Semopí e a Caern para fazermos alguma coisa nesse período de chuva. É uma ação conjunta que terá, em um primeiro momento, uma parte educativa. As pessoas precisam entender sua responsabilidade. Quem permanecer no erro será notificado”.
Enquanto isso, a balneabilidade da praia de Areia Preta ganha o sinal verde do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia (IFRN). Pelo menos, nesta semana. É o que assegura o doutor em geologia costeira e ambiental e coordenador de estudos de balneabilidade do órgão educacional. “Ali tem várias ações judiciais correndo contra a Caern. Há 11 anos eu acompanho a situação, e sempre foi assim. Uma vez por semana, recolhemos material para determinar se está própria para banho. Nesta semana, Areia Preta está própria. Mas estamos mudando o ponto de coleta para mais próximo do esgoto. Até então, fazemos bem no centro da praia. Estamos estudando com o Idema [Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente do RN] o ponto mais apropriado”.
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