Em defesa do emprego

Fernando Mineiro (Deputado estadual do PT-RN)

A polêmica sobre a ação do Ministério Público do Trabalho contra a Guararapes, como responsável solidária pelos direitos dos trabalhadores das facções terceirizadas, tem sido habilmente manipulada pelo empresário Flávio Rocha para tangenciar a questão principal. Em vez de simplesmente contestar a ação, provando, se for o caso, que sua empresa cumpre a lei, Rocha adotou uma tática de guerra para demonizar o MPT, insuflando contra os procuradores as comunidades dos municípios envolvidos, corporações patronais e oportunistas políticos.

Como é do conhecimento dos meus mais desleais adversários, defendo a geração de trabalho e renda. E defendo também o trabalhador. Não se pode admitir que os empregos sejam criados passando por cima de direitos legítimos e legais. Nenhuma empresa, por maior que seja, tem o poder de se colocar acima da lei. Ameaçar suspender contratos, fechar postos de trabalho e retirar a Guararapes do RN, se a ação trabalhista continuar, é uma forma de chantagem social. E é isso que Flávio Rocha, consciente ou inconscientemente, está fazendo.

O funcionamento do Pró-Sertão segue um modelo global que não deve ser adotado automaticamente, sem discussão para melhorá-lo, porque pode resultar em relações de trabalho injustas, desiguais. Por isso, é importante levantar algumas questões sobre o contrato da Guararapes e de outras grandes empresas que fazem parcerias com as facções potiguares.

Quais são os termos exatos dos contratos em itens como produção, pagamentos, direitos trabalhistas, prazos de entrega, condições de rescisão? Como é feita a remuneração das facções e dos trabalhadores? É verdade que a empresa contratante pode suspender as ordens de produção quando e como bem entender, sem necessidade de avisar previamente as facções e os trabalhadores, que ficam no prejuízo, sem qualquer indenização? É verdade que as facções, ao contrário, têm que avisar com antecedência se decidirem desistir do contrato? Existe garantia de demanda mínima de produção para as facções? E o que acontece quando a empresa suspende uma ordem de produção, sem aviso prévio? Se as facções tiverem tomado um empréstimo para compra de máquinas para atender à demanda suspensa, quem paga o financiamento? É verdade que as facções são obrigadas por contrato a ressarcir a empresa se ela tiver que pagar qualquer valor em ações trabalhistas, incluindo-se aí todas as custas processuais e até honorários de advogados?

De acordo com informações veiculadas na mídia, no período de 2005 a 2015 o lucro anual da Guararapes aumentou cinco vezes, batendo os R$ 7 bilhões. Uma performance que seguramente foi bastante ajudada por esse modelo de terceirização, que, ao reduzir salários e suprimir outras garantias e direitos, reduz também os custos. Outro fator que deve ter contribuído são as isenções fiscais concedidas à empresa aqui no estado. E aí cabem novas perguntas: qual é o prazo da isenção de impostos estaduais? A relação custo/benefício da isenção é boa para o RN?

Debater publicamente essas e outras questões contratuais ajudaria a entender melhor como funciona o Pró-Sertão e quem mais se beneficia dele. Também ajudaria a entender por que o programa, criado em 2013 com base nas associações comunitárias implantadas pelo ex-governador Iberê Ferreira de Souza na região do Trairi, ainda está muito longe da meta prevista: implantar 300 unidades de facção e gerar 12 mil empregos diretos no setor até 2018. Pelos dados oficiais conhecidos, em 2016, quarto ano do programa, elas eram 124 (das quais 60 já existiam antes mesmo do Pró-Sertão) e ocupavam 2.853 pessoas.

É preciso discutir e aperfeiçoar o modelo do programa, para melhorar a situação das facções que já existem e assegurar a implantação de novas unidades. Elas são fundamentais para recuperar a nossa indústria têxtil, de confecções e de vestuário, que fechou mais de 10 mil vagas, segundo dados do Ministério do Trabalho. É claro que o desempenho negativo tem a ver com a competição desleal de países como a China, que inunda o comércio brasileiro com produtos mais baratos. Mas tem a ver também com a falta de uma política industrial consistente, atrativa, que não se resuma apenas a incentivos fiscais e que proteja as pequenas empresas, as que mais empregam.

Todas essas questões ficam no ar, à espera de um debate aberto, para que a polêmica sobre a ação judicial sirva às facções, aos trabalhadores, aos empresários e ao RN em geral. E não sirva apenas a quem, de fato, tem servido até agora: aos que desejam desviar o foco da sua responsabilidade social e legal, demonizando o Ministério Público do Trabalho, e aos oportunistas de sempre, que pegam carona no caso pensando em dividendos eleitorais no próximo ano.

Foto: Vlademir Alexandre

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