25 horas de tensão e cárcere privado em São Gonçalo do Amarante

Gabriela Freire Valdir Julião - Repórteres

Exatamente 25 horas. Foi quanto durou o cárcere privado mantido por Alexsandro Silva de Lima, 30 anos, contra a jovem Jorcinara Cibelly da Silva, 20 anos, a quem ele tinha conhecido somente há poucos dias. Alexsandro era usuário de drogas há cinco anos e foragido do sistema prisional. O delegado de Extremoz, Carlos Henrique Freitas de Oliveira, que está em substituição ao titular de São Gonçalo do Amarante, afirmou que Alexsandro deve responder pelos crimes de cárcere privado, porte de arma de uso restrito e roubo de polícia, além do que já respondia. 
 
A arma que Alexsandro portava, uma pista calibre .40, afirma o delegado, é fruto de um roubo cometido contra policial na praia de Muriú durante o carnaval. Depois de prestar depoimento, Alexsandro foi encaminhado ao Centro de Atenção de Pirangi onde permanecerá até ser transferido para Alcaçuz. Jorcinara foi ouvida e liberada após depoimento.

Alexsandro Silva de Lima é foragido da cadeia de Passa e Fica, na região Agreste, e na tarde da terça-feira (26), fugiu de um cerco policial, depois que a Polícia Militar tentava cumprir um mandato de prisão emitido contra ele e foi informada de que três homens, armados, bebiam num bar na comunidade "Cheiro Verde", no distrito de Santo Antônio do Potengi, em São Gonçalo do Amarante. 

No mesmo dia, o tio dele, Henrique Eduardo Ângelo da Silva, 25 anos, morreu num confronto a tiros com a Polícia, que teria sido recebido à bala depois de dar voz de prisão aos três homens. Segundo a Polícia, esse foi um dos motivos alegados por ele, para se homiziar na casa da tia e fazer da jovem refém. A Polícia Civil de São Gonçalo do Amarante já tinha, em mãos, dois mandados judiciais de prisão contra os dois, o tio e o sobrinho, sendo que o mandado contra Alexsandro de Lima tem validade até abril de 2023. Alexsandro negou ter feito a vítima de refém e alegou "legítima defesa" quando questionado sobre o motivo de ter disparado contra a polícia. 

Jorcinara é usuária de drogas e atua como garota de programa, forma como os dois se conheceram. Ela e mais duas amigas estavam em um motel com Alexsandro quando recebeu o convite para ir até a casa dele. "Não sei o que fui fazer lá", disse logo após prestar depoimento à polícia. Jorcinara conta que dormiu grande parte do período em que foi mantida refém. "Usei crack uma vez e dormi, mas ele ficou com a arma na minha cabeça o tempo todo. Mas ele ficou fumando o tempo todo", disse. Jorcinara afirmou que a tia de Alexsandro, Maria Andréia da Silva, 43 anos, proprietária da casa, chegou a fumar crack com a dupla. A família dela informou que Jorcinara da Silva é usuária de drogas desde os 13 anos de idade, tem três filhos de pais diferentes (um de cinco anos, outro de três e mais um de dois) e é moradora de rua, porque não é mais aceita para morar com a família. O perfil é muito parecido com o de Alexsandro de Lima, que, segundo informações da Polícia, tem sete filhos, todos de mães diferentes. 

ENTREVISTA

Arredio e ainda sob efeito de entopercentes, o artesão Alexsandro Lima nega ter feito Jorcinara da Silva refém e diz estar arrependido do que fez.

Você estava fazendo a Jorcinara refém?

De maneira nenhuma. 

Ela é namorada sua?

Não.

Você estava com ela em um motel?

Estava. Estava. 

Você está arrependido?

Estou. Estou arrependido.

Você tinha intenção de matar a refém?

Eu não tinha a intenção de matar nem de atirar.

Artesão invadiu casa da tia para fugir da polícia

O conflito com Alexsandro continuou quando a Polícia Militar localizou por volta das 17h30, na quinta-feira (29), Alexsandro de Lima na rua 31 de Março, uma rua que fica à direita do campo de futebol do Sport, no centro de São Gonçalo do Amarante. Ao pressentir a guarnição da PM, ele entrou na casa da tia dele, Maria Andréia da Silva, 43 anos, e ela não teve como voltar à sua residência. 

A tia disse que tinha saído para o trabalho e ido preencher uma ficha de inscrição para um filho trabalhar na construção do aeroporto de São Gonçalo do Amarante. Em cobersa com a imprensa antes do sobrinho se entregar à polícia, Maria Andrea disse que já tinha proibido o sobrinho de entrar em sua casa, onde não pode mais entrar "depois que a confusão começou".

Durante todo o dia, pelo menos 10 guarnições da Polícia Militar, principalmente da Rocam e do Bope revesavam-se no local do cárcere privado, com a mobilização de pelo menos 30 homens, entre praças e oficiais, além de viaturas do Corpo de Bombeiros, porque havia ameaça de Alexsandro Medeiros atear fogo na casa, e ainda do Samu, que ficou com uma equipe de prontidão o tempo inteiro para o caso de ocorrer o pior e alguém sair ferido.

Depois de isolar o local colocando fitas e viaturas para evitar a presença de curiosos e da própria imprensa a uma distância de 150 metros, alguns moradores da própria rua 31 de Março sofreram com o problema, muitos não puderam sair de casa durante toda a noite de quinta e manha e tarde de ontem.

foi o caso de Pedro Francisco da Silva. Ele disse que passou a noite sem dormir "e não fui nem trabalhar". Depois, saiu de casa cedo e ao voltar pra casa, pra pegar um documento, teve de pedir permissão para entrar em sua residência, que fica uma dez casas antes da moradia da tia de Alexsandro.

Residência tinha latas de bebidas e marcas de tiros

A casa onde ocorreu o episódio foi tomada por uma multidão de curiosos logo que a polícia deixou o local. Desrespeitando o isolamento proposto, muitos jovens invadiram a casa em um ato que beirava o vandalismo. O grupo foi controlado quando duas viaturas do BP Choque retornaram. 

A casa onde Alexsandro Lima fez Jarcinara da Silva de refém por 25 horas é humilde. Pintada de verde água, tem teto baixo e sem forro e é dividida em três quartos pequenos, sala cozinha e banheiro. Não possui muros, nem quintal e as janelas são pequenas.

Após averiguação da Polícia Militar, pôde constatr-se que a residência estava muito suja, com lixo espalhada em todos os cômodos e latas de bebida espalhada pelo chão. As marcas de perfuração de balas eram muitas. A fachada somava 10 marcas e a sala estava completamente alvejada, resultado da troca de tiros ocorrida ainda na noite de quinta-feira. Segundo moradores, a casa era utilizada como base para uso de drogas.

Personagens e desfecho do caso

PERFIL ALEXSANDRO - Artesão, 30 anos.

De acordo com a tia-avó Elisara Guedes, 45, ele sempre foi um rapaz tranquilo e era uma "ótima pessoa" apesar de já ter sido preso acusado de assalto. Começou a usar drogas há cerca de cinco anos e estava trabalhando fazendo vasos e estátuas de cerâmica. É pai de sete filhos, fruto de um relacionamento com três mulheres.

PERFIL JORCIARA - desempregada, 20 anos.

De acordo com a tia Érica Cristian, sempre foi problemática e não era aceita pela família. É usuária de drogas desde os 13 anos, nunca trabalhou e já se prostituiu para manter o vício. Cursou até a 5ª série do ensino médio e mora nas ruas. É mãe de duas crianças, que vivem sob a guarda da avó materna.

LIGAÇÃO

Se conheceram quando ela e mais algumas amigas foram chamadas para um programa. Na manhã de quinta-feira o casal teria ido à casa da mãe de Jarciara a fim de arrecadar dinheiro, uma quantia estimada entre R$ 5 e R$ 17 para acertar contas com o próprio Alexsandro. Esse dinheiro teria sido dado para que ela comprasse drogas para o casal.

DESFECHO

Depois de prestar depoimento, Jorciara afirmou que consumiu crack uma vez e dormiu por quase todo o período em que Alexsandro negociava com a polícia. Já Alexsandro teria ficado consumindo droga por todo tempo. Jorciara ainda disse que a tia de Alexsandro, e proprietária da casa, também consumiu crack com o casal. O casal foi encaminhado para a Delegacia de Polícia de São Gonçalo do Amarante onde prestaram depoimento ao delegado Cláudio Henrique. De acordo com o capitão Givanildo Gomes, que liderou o processo de negociação, o momento mais complicado foi a fase do primeiro contato. "Ele estava sob efeito de entorpecentes e não falava coisa com coisa", afirmou. 

Passo a passo 

Início da perseguição

Terça-feira, dia 26

14h30


Alexsandro Silva de Lima fura o cerco da Polícia Militar, quando bebia em um bar na comunidade conhecida como "Cheiro Verde", no distrito de Santo Antonio dos Barreiros, em São Gonçalo do Amarante. Em confronto com a polícia, morre a tiros o sobrinho dele, Henrique Eduardo Ângelo da Silva, 25 anos, tinha mandado de prisão em aberto por ter deixado de comparecer à prisão, onde cumpria pena no regime semiaberto.

O cárcere privado

Quinta-feira, dia 28

17h30 

Uma guarnição da Polícia  Militar do Rio Grande do Norte visualiza Alexsandro Silva de Lima na na rua 31 de março, mas quando ele viu a viatura, homizia-se na casa da tia Maria Andrea da Silva e faz de refém Jorcinara Cibelle da Silva, 20 anos.

18h30 

A PM tenta entrar na casa para dar voz de prisão a Alexsandro de Lima, que reage à bala atirando contra os policiais que recuam. Segundo a Polícia, ele deu pelo menos seis tiros de pistola.

Sexta-feira, 1ª

4 h

Os negociadores do Batalhão de Operações Especiais (Bope) da Polícia Militar consegue abrir, pela primeira vez, diálogo com Alexsandro de Melo.

5 h

Uma avó de Alexsandro de Melo faz contato com o neto, pedindo para que ele se entregue, mas ele respondeu, afirmando "que hoje eu vou resolver a minha vida, eu vou tomar destino da minha vida".

12 horas

A Polícia entrega mantimentos - pão, biscoito e água - a Alexsandro de Lima, que ameaçou matar a mulher, caso não fosse atendida a sua exigência por alimento.

13h30

Uma ex-mulher e os sete filhos de Alexsandro de Lima, que ele tem  com mulheres diferentes chegam para conversar com ele, a seu pedido, segundo informou a porta-voz da PM, capitão Geórgia Câmara, a qual diz que o homem já se encontra mais calmo e disposto a negociar com a Policia, depois das oito tentativas de negociação, sem sucesso, pela madrugada e manhã da sexta.

14 h

O militante dos Direitos Humanos, Marcos Dionísio Medeiros Caldas, chega para tomar conhecimento da situação e negociar com Alexsandro de Lima.

16h30 

Familiares da mulher mantida como refém desde o começo da noite da quinta, é identificada pelos familiares como Jorcinaria Cibelle da Silva, 20 anos, usuária de drogas, que Alexsandro de Lima havia conhecido há uma semana.

17h20 

Marcos Dionísio Caldas, o coronel PM Marcos Vinícius e um tio de Alexsandro de Lima tentam, por telefone, negociar com ele a liberação da refém e que se entregue à Polícia.

19 horas

Alexsandro de Lima entrega-se à Polícia, depois de uma negociação que ainda contou, durante todo o dia, com o capitão Givanildo Gomes, especialista nesse tipo de negociação e já atuou em casos semelhantes dentro e fora do Rio Grande do Norte.

Fonte: TN Online

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