Superior Tribunal de Justiça, em Brasília - Foto: Marcello Casal Jr. / Agência Brasil
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu, esta semana, o direito de uma mãe adotar a própria filha, de mais de 18 anos de idade. Singular, a decisão foi tomada não só porque a moça entregue à adoção quando criança é, atualmente, maior de idade e manifestou o desejo de ser adotada pela mãe biológica, mas também porque a família adotiva não se opôs à vontade da mãe biológica e de sua filha.
Embora não houvesse discordância de nenhuma das partes, o pedido de adoção foi negado por um juiz de primeiro grau que considerou que a solicitação violaria o Artigo nº 39 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que estabelece que, além de excepcional, a adoção é uma medida irrevogável.
Esse entendimento foi mantido em segunda instância, pelo Tribunal de Justiça, onde o caso tramita em segredo. Segundo o STJ, o tribunal também entendeu que autorizar o restabelecimento do vínculo jurídico entre mãe e filha biológicas geraria um precedente que resultaria em insegurança jurídica para outros processos adotivos.
A mãe biológica então recorreu ao STJ, cuja Quarta Turma teve opinião diferente e reverteu as decisões de primeiro e segundo grau. Analisando o histórico do caso e os argumentos apresentados pela autora do pedido, o relator do recurso, ministro Raul Araújo, entendeu que a primeira adoção, autorizada quando a moça ainda era criança, de fato foi válida e, portanto, era irrevogável. Contudo, como a adotada agora é adulta e capaz, o novo processo é regido pelo Código Civil, e não mais pelo ECA.
“A lei não traz expressamente a impossibilidade de se adotar pessoa anteriormente adotada. Bastam, portanto, o consentimento das partes envolvidas, ou seja, dos pais ou representantes legais, e a concordância do adotando”, argumentou o ministro em seu voto. A legislação brasileira estabelece que a adoção depende da concordância do adotando quando este tiver mais de 12 anos de idade – e que, sempre que possível, deve-se levar em conta a opinião da criança ou adolescente, independentemente de sua idade.
Para a diretora-jurídica da Associação Nacional de Grupos de Apoio à Adoção (Angaad), Thandra Sena, a decisão do STJ cria um precedente jurídico muito específico, aplicável apenas em casos muito particulares. “Até onde sabemos, trata-se de uma moça que, embora adotada ainda criança, manteve alguma espécie de vínculo com a mãe biológica. E cuja família adotiva não se opôs ao desejo dela voltar a ser adotada pela mãe biológica”, disse Thandra à Agência Brasil.
De fato, segundo o STJ, no processo, a mãe biológica contou ter entregue a menina para adoção por não ter, na época, condições pessoais e financeiras para criá-la. Porém, após a conclusão do processo, a família adotiva permitiu que ela continuasse visitando a filha, o que fez regularmente ao longo dos anos, mantendo uma relação próxima com a menina. Com o passar do tempo, as duas foram se aproximando cada vez mais, até que surgiu a vontade recíproca da adoção. A família adotiva não se opôs.
Indicada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para comentar o assunto, a advogada especialista em Direito da Família, Diana Geara, considera que, ao reconhecer a validade da primeira adoção, concluída quando a moça ainda era criança, o STJ mantém a irrevogabilidade das sentenças de adoção como regra.
“Isso é importante porque não é incomum processos pleiteando a revogação das decisões. Mas pode-se dizer que este julgamento é quase uma exceção, uma decisão específica que não afetará os processos envolvendo crianças e adolescentes, que são a maioria. Além do mais, é bastante incomum, já que, na maioria dos casos, há um rompimento das relações entre a criança adotada e a família natural”, comentou Diana.
Agência Brasil
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